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sábado, dezembro 13, 2025

⚔️ O Moinho e o Gigante (Por Que a Realidade de Todos é Inegociável)

 
Epígrafe: "O que não conseguimos enxergar, nossa mente transforma em defeito alheio."

A Lâmina da Loucura e o Diagnóstico Oftalmológico

A genialidade de Dom Quixote reside em nos forçar a questionar o que é real. E, de fato, existe uma teoria, frequentemente debatida na internet, que sugere, de forma anedótica e simplificada, que a "loucura" do nosso triste anti-herói poderia ser apenas um problema de visão — miopia ou astigmatismo severo. Ele veria moinhos de vento como gigantes porque a visão distorcida os tornaria amorfos, e sua mente preencheria a lacuna com a fantasia dos romances de cavalaria.

Mas é impossível aceitar que a obra de Cervantes — uma profunda crítica social, filosófica e psicológica — se resuma a uma simples receita de óculos. O que o narrador e o fiel Sancho Pança nos mostram é muito mais complexo: a realidade é, fundamentalmente, subjetiva.

Dom Quixote não via gigantes por falta de nitidez; ele os via por excesso de idealismo.

A Tirania da Realidade Única

O problema não é o que Dom Quixote via, mas a nossa reação ao que ele via.

Nós vivemos sob a Tirania da Realidade Única. Acreditamos que o mundo é como o vemos, e qualquer desvio dessa nossa percepção não é uma outra visão, mas um erro, uma falha, uma distorção que precisa ser corrigida, seja com um "óculos" ou com uma "dose de realidade."

Hoje, essa dinâmica se manifesta na polarização extrema:

  • A Confusão da Premissa: Não conseguimos conceber que, se a premissa de alguém é radicalmente diferente da nossa, a sua conclusão (a sua "realidade") também será. Se uma pessoa parte da premissa de que a economia está ótima (por seus próprios motivos), ela não verá a pobreza que a outra pessoa (cuja premissa é a dificuldade de fechar as contas) vê.

  • A Falta de Empatia Visual: Tentar enxergar o mundo com os olhos dos outros é um exercício exaustivo. É muito mais fácil e confortável diagnosticar o outro com um "problema". Aquele que tem uma ideologia diferente, uma prioridade financeira oposta, ou um medo que não faz sentido para nós, é facilmente rotulado como ignorante, mal-intencionado, ou, na versão moderna, "burro."

O Acordo Quixotesco (A Necessidade do Consenso)

Em alguns momentos da obra, Cervantes sugere que Dom Quixote tem um nível de consciência sobre sua condição, chegando a propor a Sancho um acordo: cada um deve, em alguma medida, acreditar no que o outro vê.

Esse é o ápice da Alteridade e é o nosso maior desafio cívico. Não se trata de concordar, mas de validar que a realidade do outro é inegociável para ele.

Não podemos nos dar ao luxo de reduzir a experiência alheia a um simples defeito técnico. A dor da outra pessoa, o seu medo, a sua esperança — eles são gigantes tão reais quanto o moinho.

A evolução do nosso pensamento não está em corrigir o grau de quem está ao lado, mas em aceitar que, na vastidão da experiência humana, todos temos um óculos de grau único, formado por nossas lutas, medos, heranças e ideais.


Pra pensar um pouco:

"A visão do outro nunca é um mero defeito oftalmológico. É um universo inteiro de dor, medo e esperança que se recusa a ser enquadrado pelo seu manual de realidade."

⚔️ O Moinho e o Gigante (Por Que a Realidade de Todos é Inegociável)

  Epígrafe: "O que não conseguimos enxergar, nossa mente transforma em defeito alheio." A Lâmina da Loucura e o Diagnóstico Oftal...