Declus

Tentando tapar os buracos na minha cabeça...
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sábado, agosto 23, 2025

Camus e o Café Requentado da Rotina

 
Albert Camus dizia que o maior problema filosófico de todos é o suicídio. Em outras palavras: diante do absurdo da vida, por que insistimos em levantar da cama?

Talvez a resposta esteja no despertador das 6h, no ônibus lotado, no café requentado que já perdeu o aroma mas ainda aquece. É nesse cenário nada heroico que o absurdo se revela: vivemos uma rotina repetida, uma vida que parece não levar a lugar nenhum — e ainda assim seguimos.

Para Camus, o absurdo nasce justamente desse atrito: de um lado, nossa vontade infinita de sentido; do outro, um universo que insiste em ficar em silêncio. Não há manual, não há resposta final. Só o eco vazio das mesmas tarefas que recomeçam todo dia.

Mas — e aqui está a virada — o absurdo não é motivo para desistir. Pelo contrário, é o convite para viver apesar de tudo. É rir diante do café frio, é encontrar poesia no tédio, é desafiar o destino simplesmente levantando da cama e repetindo o ritual.

Se Sísifo empurrava a pedra montanha acima, nós empurramos planilhas, boletos e xícaras de café requentado. E, como dizia Camus, precisamos imaginar Sísifo feliz — porque o sorriso, mesmo pequeno, é a nossa forma de revolta.

No fim, talvez o café velho seja perfeito: não é delicioso, mas é suficiente para nos lembrar de que estamos vivos.

quarta-feira, agosto 06, 2025

📌 Post Extra — A Difícil Arte de Não Exagerar

 Hoje chegou minha nova garrafa térmica — uma Stanley.

E, com ela, uma promessa sussurrada: menos café, mais chá.
Mate de coca, pra ser mais exato — dizem que é bom pro estômago.
E, apesar das piadinhas inevitáveis, o dia passou com menos cafeína e mais silêncio.

E aí me peguei pensando:
por que é tão difícil viver no meio do caminho?
Sem extremos, sem exageros, sem repetir os rituais que juramos abandonar todo domingo à noite?


O café e o caos

Tomo café desde os sete anos, herança direta da minha mãe.
Café quente, preto, forte, doce de vida.
A cada tentativa de diminuir, a promessa: “Agora vai”. Mas... não vai.
A pálpebra treme, o coração acelera, a mente tagarela... e mesmo assim, a xícara se enche de novo.

O problema nem é o café.
É o excesso.
Que mora em tudo que amamos demais: no volume da música, nas conversas que nos atravessam, nas ideias que não cabem no corpo.


O equilíbrio que parece estranho

Queria encontrar esse ponto de equilíbrio que tanto se fala.
Mas confesso: toda vez que me aproximo dele, sinto falta do caos.
Talvez porque o caos seja mais familiar, mais confortável do que o silêncio que não sabemos preencher.


Epígrafe:

“Talvez o equilíbrio seja só isso: um exagero que cansou.”

quinta-feira, junho 19, 2025

Voltaire, cafés, prisões e um último passeio por Paris

 

“Se o café é veneno, ao menos é um veneno lento… e delicioso.”
Ninguém sabe se Voltaire disse exatamente assim, mas a lenda faz sentido: conta-se que ele bebia quarenta xícaras por dia, muitas delas turbinadas com chocolate. Entre goles apressados, o filósofo iluminista escrevia cartas ferinas, peças de teatro e tratados que fariam reis espumar de raiva — e leitores vibrarem de riso.


🏰 Da Bastilha ao banimento (e volta)
François-Marie Arouet, o Voltaire, nasceu em 1694 e logo aprendeu que palavras têm preço. Aos 23 anos, uma piada sobre o Regente lhe rendeu a primeira temporada na Bastilha. Ali, transformou a cela em gabinete literário e decidiu trocar o próprio sobrenome por um anagrama audacioso: Voltaire. Saiu da prisão mais famoso do que entrou, mas também vigiado para sempre.
Quando, anos depois, voltou a provocar nobres poderosos, ganhou de brinde a expulsão de Paris. Foi exilado para a Inglaterra, onde descobriu as liberdades do café londrino, devorou Locke, admirou Newton e aprendeu que a tolerância pode ser uma virtude política — não apenas cristã.


💡 O iluminista incendiário
De volta ao continente, Voltaire virou usina de ideias: poemas satíricos, tragédias gregas reimaginadas, panfletos contra o fanatismo religioso. Em parceria (e disputa amigável) com Diderot e d’Alembert, ajudou a fomentar a Enciclopédia, aquele audacioso Google do século XVIII que queria reunir todo o saber humano em prateleiras de papel.
Ele atacava a Igreja quando esta se confundia com tirania, mas também criticava filósofos de gabinete que ignoravam o povo. Seu lema oficioso — “Esmagai a infame!” — tinha endereço certo: a intolerância travestida de dogma.


🎲 O golpe de mestre na loteria do rei
Pouca gente lembra que Voltaire também foi matematicamente travesso. Em 1729, aliou-se a um amigo matemático para explorar uma falha nas regras da loteria estatal francesa: compraram bilhetes estratégicos, repartiram o prêmio astronômico e garantiram a independência financeira do filósofo. Moral da história? Às vezes a razão ilumina bolsos antes de iluminar mentes.


📚 Livros que cortam como espada

  • Cartas Filosóficas (1734): análise apaixonada da Inglaterra liberal; proibido na França.

  • Cândido (1759): sátira implacável ao otimismo ingênuo; leituras rápidas, reflexões longas.

  • Tratado sobre a Tolerância (1763): defesa de Jean Calas, protestante injustamente executado; um manifesto ainda atual.
    Cada obra traz a marca registrada de Voltaire: ironia rasgada, frases curtas, argumentos afiados.


⚖️ Entre cafeteiras e tribunais
Voltaire usava salões parisienses como plataformas de debate. Mas, expulso da capital, montou seu próprio “reino” em Ferney, na fronteira com a Suíça. Ali recebia visitantes, escrevia sem censura imediata e gerenciava a produção de relógios e sedas que enriqueciam a região. Liberdade também se cultiva com gestão pragmática.


🔍 O detalhe poético do fim
Em 1778, depois de quase trinta anos longe, Voltaire voltou a Paris para apresentar uma peça. Foi recebido como estrela pop: multidões na porta, condecorações, jantares. Morreu poucas semanas depois — dizem que entre páginas e canecas de café. Ironicamente, a Igreja proibiu o enterro em solo sagrado. Resultado: o corpo foi levado de contrabando, à noite, num coche coberto.
Treze anos mais tarde, já em plena Revolução, seus restos mortais desfilaram triunfalmente pelas ruas de Paris rumo ao Panteão. A cidade que o banira aclamou-o com tochas e música. A carroça fúnebre virou cortejo cívico: última gargalhada do velho satírico.


❤️ Por que eu dividiria uma xícara com Voltaire
Porque ele unia sarcasmo e ternura. Sabia que rir de reis e padres era, antes de tudo, um gesto de esperança. Porque defendia a dúvida como passatempo nobre, a liberdade como espuma de café obrigatória. E porque, mesmo milionário de loteria, não parou de cutucar o poder — “escrever é agir”, dizia. Entre goles de arábica, acho que trocaríamos deboches sobre algoritmos modernos, fanatismos reciclados, loterias criptográficas… e talvez ele me lembrasse: “Se o café não acordar sua razão, nada mais acordará.”

🇯🇵 O Soldado Que Lutou Contra o Fim da Guerra (e o Medo de Acreditar na Paz)

  "Nem toda paz é fácil de acreditar. Especialmente depois de tanto tempo na trincheira." A Guerra que Terminou Lá Fora, Mas Não D...