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Tentando tapar os buracos na minha cabeça...
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segunda-feira, agosto 11, 2025

🧠 Reflexo Filosófico — O que você resiste… assiste (Jung e o monstro no porão)

 
"Aquilo que você resiste, persiste."

Carl Gustav Jung

O problema de fingir que não há um monstro no porão é que ele começa a arrastar móveis lá em cima. E, mais cedo ou mais tarde, ele sobe pra tomar café com você.

Jung não falava de monstros mitológicos, mas de algo muito mais próximo: nossos medos, traumas, frustrações e desejos inconfessáveis. Tudo aquilo que a gente empurra pro fundo da mente achando que desaparece. Só que não desaparece. Vira sintoma.

A frase resume um dos pilares da psicologia junguiana: recalcar não resolve, só transforma o problema em outra coisa. Aquilo que você evita olhar de frente acaba se infiltrando por trás — nos sonhos estranhos, nas escolhas erradas, nos estalos de raiva sem aviso.

O que você resiste não apenas persiste: ele se disfarça. E às vezes se veste de trabalho excessivo, de distração constante ou de um otimismo exagerado. O porão psicológico vira palco para uma peça cujo roteiro você esqueceu que escreveu.

Jung defendia o encontro com a sombra: reconhecer o que é incômodo em si mesmo, sem fugir, sem idealizar. Porque só quem reconhece sua sombra pode integrar-se de verdade. O resto é pose.

Talvez seja hora de descer as escadas. Levar uma lanterna. E, com sorte, descobrir que o monstro só queria ser escutado.

segunda-feira, julho 07, 2025

Ícaro, o Sol e a Pressa de Brilhar

 🕊️ Ícaro tinha asas.

Mas não tinha freio.
Nem paciência.

No mito grego, ele e o pai, Dédalo, fogem de um labirinto usando asas feitas de penas e cera.
A instrução era clara:
“Não voe nem tão baixo que a umidade pese as asas, nem tão alto que o sol as derreta.”
Mas Ícaro não resistiu.
Subiu.
E caiu.


🔥 A metáfora nem tenta ser sutil

Quem nunca teve pressa de brilhar?
De mostrar serviço, talento, presença?
De provar (pra si e pro mundo) que consegue, que merece, que chegou?

Ícaro é o símbolo dessa ansiedade performática:
voar antes de saber pousar.
Subir demais, rápido demais, acreditando que o céu é o limite — e ignorando que o sol que brilha também queima.


📱 Na era dos virais, Ícaro teria um TikTok

Provavelmente com legendas como:
“Voando alto, beijos pros haters.”
“Quem nasceu pra andar não entende quem nasceu pra voar.”
Mas o vídeo final seria um frame congelado, o sol estourado na lente… e o silêncio depois do tombo.

🎭 A vaidade tem filtros.
A ambição, algoritmos.
E a queda… ainda é sem cortes.


🧠 Mas será que o erro foi querer subir?

Ícaro não é só sobre imprudência.
É também sobre o conflito entre o impulso e o medo.
A vontade de ultrapassar limites e a fragilidade da estrutura que sustenta esse voo.

💡 Não é errado desejar o alto.
Errado talvez seja não entender o que isso exige.
Treinamento. Maturidade. Cuidado.
E, talvez, a sabedoria de voar baixo por um tempo — até que as asas estejam firmes de verdade.


🧩 A tragédia de Ícaro também é poética

Ele caiu, sim.
Mas caiu tentando.
Não ficou preso no labirinto.
Não se resignou à condição de prisioneiro.

📎 Às vezes, o medo nos mantém no chão.
Outras vezes, o desejo nos cega.
O equilíbrio — aquela faixa estreita entre céu e mar — talvez seja o ponto mais difícil da trajetória.


🕯️ E se o que nos derruba não for o erro, mas a pressa?

Na ânsia de provar, a gente atropela o tempo.
Posta antes de pensar.
Responde antes de ouvir.
Sobe sem verificar se aguenta ficar.

Ícaro virou símbolo da arrogância.
Mas pode ser também um lembrete para calibrar o voo.
Pra ouvir conselhos.
Pra ajustar as asas.
E, principalmente, pra lembrar que o sol é bonito — mas não perdoa.

domingo, junho 15, 2025

Estoicismo: sabedoria antiga, rótulos modernos

 🏛️ O estoicismo nasceu por volta do século III a.C., em meio ao burburinho das ruas de Atenas. Seu fundador, Zenão de Cítio, não era um filósofo acadêmico de toga e lousa — mas um homem que falava para o povo, sob os pórticos (stoa) da cidade. Daí o nome que daria origem a uma das correntes mais duradouras da filosofia ocidental.

🧘‍♂️ Curiosamente, o estoicismo moderno que encontramos hoje nas redes sociais, em livretos de autoajuda ou em vídeos motivacionais, guarda tanto traços autênticos quanto distorções gritantes da tradição original. Frases como “Não sofra por antecipação” ou “Controle o que está ao seu alcance” pipocam como slogans prontos para consumo. Sim, elas têm origem estoica. Mas isoladas de seu contexto, ganham uma aparência de manual de produtividade — e perdem a densidade ética que carregavam.

🧱 A proposta estoica original era robusta e exigente: viver de acordo com a natureza racional do universo, cultivar a virtude como o bem supremo e aceitar com serenidade aquilo que não está sob nosso controle. Não se tratava de “positividade tóxica” ou indiferença afetada. Ao contrário, era uma disciplina constante, que exigia reflexão diária, autoconsciência e um profundo senso de responsabilidade diante do mundo.

👤 Três nomes sobressaem nessa escola: Epicteto, um ex-escravo que se tornou mestre de liberdade interior; Sêneca, conselheiro imperial e escritor de frases cortantes; e Marco Aurélio, o imperador-filósofo que registrava pensamentos para si mesmo — e acabou inspirando gerações. Cada um à sua maneira tentou responder à pergunta: Como viver bem, mesmo em meio ao caos?

📜 No entanto, é curioso (e um tanto irônico) imaginar que nenhum deles provavelmente se chamaria “estoico” nos termos que usamos hoje. Assim como Jesus nunca se diria cristão, os pensadores estoicos estavam mais preocupados com a prática da filosofia do que com rótulos. A ideia de “estoicismo” como identidade estável, exportável e marqueteável é muito mais moderna do que se imagina.

🌀 O mundo contemporâneo, com sua ânsia por respostas rápidas, transformou muitos conceitos filosóficos em atalhos emocionais. O estoicismo virou, por vezes, um “coach espiritual” com capa grega. Mas isso não quer dizer que ele tenha perdido valor. Pelo contrário: ao olhar com mais profundidade, encontramos nessas ideias milenares uma possibilidade real de enfrentamento do sofrimento, da ansiedade e da imprevisibilidade — mas sempre com exercício, humildade e tempo.

⚖️ Um exemplo poderoso é o famoso dichotomy of control, que Epicteto explorava com precisão: distinguir o que depende de nós e o que não depende. Essa chave, se compreendida de fato, pode transformar decisões, aliviar pressões e libertar da ilusão de controle total. Mas, como tudo no estoicismo, essa clareza não vem num post de 280 caracteres. É um caminho, não um atalho.

📚 Quando revisitamos os textos originais, somos lembrados de que a filosofia estoica não é sobre evitar emoções — mas sobre não ser escravizado por elas. Não é sobre ser frio — mas sobre aquecer-se internamente com o fogo da razão e da virtude. E mais: é sobre agir com justiça, mesmo quando o mundo parece injusto.

🔎 Em tempos de exposição constante, rotinas saturadas e angústias difusas, o estoicismo pode sim oferecer um farol. Mas é preciso evitar a tentação de reduzi-lo a uma caixinha de frases inspiradoras. Como toda filosofia viva, ele exige envolvimento, questionamento e, principalmente, prática constante. E talvez aí esteja sua beleza: mesmo mal interpretado, ainda resiste. Ainda fala. Ainda convida.

🧩 No final das contas, a pergunta não é “como ser estoico”, mas como viver bem neste mundo imperfeito. E nisso, Zenão, Epicteto, Sêneca e Marco Aurélio ainda têm muito a nos dizer — se estivermos dispostos a ouvir além dos slogans.

📌 Post Extra — O Dragão na Garagem e o Olho do Ceará

  Meu pai, que saiu do Ceará aos 18 e hoje já passou dos 70, gosta de contar histórias do sertão. Uma delas reapareceu na sala esses dias, ...