Declus

Tentando tapar os buracos na minha cabeça...
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quinta-feira, outubro 02, 2025

🤖 A Normalidade que Anestesia: Estamos Virando Gente Normótica?

 "Não está doente. Mas também não sente."

A Máquina do "Tudo Funciona"

Vivemos na era dourada da funcionalidade. Tudo funciona. Os aplicativos entregam 📦, os caixas automáticos resolvem a vida financeira, e os fones de ouvido nos mantêm hermeticamente protegidos do mundo. Produzimos, consumimos, pagamos as contas, e a engrenagem social não para de girar.

Mas, e o que acontece por dentro? E o coração? E a empatia?

O risco é que estamos nos tornando adultos "normóticos": socialmente ajustados, produtivos, competentes em seguir regras e otimizar processos... e absolutamente indiferentes ao que realmente importa.

O Normótico e a Desconexão Disfarçada

O termo normótico (cunhado na psicologia) descreve essa condição: a pessoa que é tão obsecada pela normalidade e pela adaptação que acaba perdendo a própria capacidade de sentir e de se conectar.

Ele não está clinicamente doente, mas também não sente o entusiasmo, a raiva justa ou a dor profunda. Ele opera no piloto automático, seguindo um roteiro silencioso.

A pressa é o sintoma mais claro dessa anestesia. É a pressa que sufoca a escuta ativa (aquela de verdade), que nos impede de olhar nos olhos de quem nos atende. É o vício em otimização que nos convence de que o tempo gasto sentindo é um tempo desperdiçado.

Vivemos tanto no automático, tentando cumprir a agenda da normalidade, que mal percebemos quando a nossa alma parou de responder.

A grande ironia é que, para caber na sociedade, a gente precisa se encolher emocionalmente. O custo de ser normal e produtivo é a perda da nossa capacidade de ser humano em toda a complexidade que isso exige. A normalidade se tornou, ironicamente, a nossa maior doença.


domingo, setembro 21, 2025

🎭 Post Extra — Ninguém Espera a Nova Inquisição

 

📌 Epígrafe:
“Quando a comédia é censurada, não sobra nem a almofada da piada para nos salvar.”

“Ninguém espera a Inquisição Espanhola!” — grita o bordão que atravessou gerações, vindo do nonsense genial do Monty Python.

Na esquete, o terror histórico é parodiado por três cardeais atrapalhados que irrompem em cenas cotidianas para aplicar torturas ridículas: almofadas fofinhas, cadeiras confortáveis, escorredores de prato. O medo? A surpresa? A eficiência? Tudo se dissolve em trapalhadas, listas confusas e risadas.

Mas a graça do quadro é também o seu veneno. Porque, na vida real, a inquisição nunca avisa. Ela entra pela porta quando você menos espera. E diferente das almofadas macias, ela corta fundo.

Basta olhar ao redor. Um talk show cancelado porque o apresentador ousou criticar um governante. Um jornal processado porque publicou algo incômodo. Uma peça de teatro censurada sob pretexto moral. Uma piada que vira crime. Aos poucos, o riso dá lugar ao silêncio — e o silêncio, quando imposto, não tem nada de engraçado.

O Monty Python transformou a inquisição em caricatura, para que ríssemos da incompetência e do absurdo. Mas quando a vida real resolve imitar a arte, a piada perde a graça rápido demais.

Porque ninguém espera a nova inquisição. Mas quando ela chega, não traz almofadas.

segunda-feira, agosto 25, 2025

LinkedIn: o Olimpo do Networking Sem Alma

 
No Olimpo digital, Deus é CEO.

Anjos são gestores.
E o inferno tem uma placa de neon que pisca: “gratidão pela conexão 🙏”.

O LinkedIn é o templo onde o culto à produtividade encontra sua liturgia própria. Ali, os perfis são mais caprichados do que qualquer bio no Instagram: cada curso, cada certificação, cada workshop online vira medalha de guerra — e a timeline parece um mural de vitórias corporativas eternas.

Mas por trás do sorriso em fundo azul e da enxurrada de “cases de sucesso”, fica a pergunta incômoda: estamos realmente ali para trabalhar, ou para sermos vistos?

A lógica do LinkedIn é quase religiosa. A meritocracia é dogma, os certificados são relíquias, e os posts motivacionais funcionam como sermões: frases curtas, impactantes, muitas vezes ilustradas com uma imagem de alguém no topo de uma montanha. A mensagem subliminar é sempre a mesma: “se você não chegou lá, é porque não tentou o suficiente”.

Claro, existe valor em celebrar conquistas. Mas há também uma espécie de arqueologia do corporativês: camadas e camadas de palavras que soam importantes, mas dizem pouco. “Sinergia”, “resiliência”, “mindset exponencial”, “networking estratégico”… um idioma que, traduzido, poderia caber numa frase simples: “olha como eu sou útil, me contrata, me valida”.

A ironia é que, enquanto lá se busca emprego com afeto forçado, no Tinder talvez haja mais autenticidade: menos PowerPoint, mais pele. Já pensou se trocássemos os papéis? Procurar amor no LinkedIn e vaga no Tinder? Quem sabe desse certo: no mínimo, a sinceridade salvaria tempo.

No fim, o LinkedIn talvez seja isso mesmo: uma vitrine. Uma feira de talentos, inseguranças e ambições. Mas se todo Olimpo é também teatro, que ao menos aprendamos a rir do nosso papel nele. Afinal, até os deuses corporativos precisam descer para tomar café.

terça-feira, agosto 19, 2025

📌 Post Extra — América ou Iracema?

 
Há algo que sempre me incomodou: o fato dos cidadãos dos Estados Unidos se chamarem simplesmente de americanos.

Não estadunidenses, não ianques, não EUA. Apenas “americanos”.

Como se o restante do continente fosse rodapé irrelevante da história. Como se o Canadá e o México — que também são América do Norte — não existissem. E, pior ainda, como se os povos originários que já viviam por aqui, séculos antes do primeiro navio europeu, fossem meros figurantes descartáveis.

O curioso é que nem o argumento histórico de “foi aqui que Colombo aportou primeiro” serve para justificar. Colombo não desembarcou em Nova York nem na Flórida: as primeiras paradas foram no Caribe, em Cuba e ilhas próximas. Ou seja: nem o “berço do Novo Mundo” os EUA podem reivindicar sem distorcer os fatos.

Essa apropriação do nome “América” não é inocente. Dialoga com uma mentalidade de superioridade cultural que se exporta em forma de marketing: o famoso American way of life. Um estilo vendido como modelo de liberdade, mas que muitas vezes esconde isolacionismo, desconfiança e até um certo desprezo por quem não fala inglês com sotaque texano.

Enquanto isso, aqui do lado de baixo, carregamos uma ironia silenciosa: na língua portuguesa, América é anagrama de Iracema.
E Iracema, personagem indígena idealizada por José de Alencar, simboliza justamente a terra ferida, explorada e reinventada.
Enquanto eles transformam “América” em slogan de poder, nós lembramos que há também a cicatriz, o silêncio e a resistência que a palavra carrega.

No fim das contas, fica a provocação:
Ser “americano” é realmente um privilégio — ou apenas mais uma fantasia de marketing bem vendida?


📜 Epígrafes

“Se os EUA são a América, então meu quintal é o Jardim Botânico.”

“Chamar os EUA de América é o mesmo que eu abrir a geladeira, achar um tomate e dizer que descobri a agricultura.”

“Na real, chamar os EUA de América é como dizer que o Robocop é só um policial com prótese. Forçado, reducionista e, claro, meio ridículo.”

domingo, julho 27, 2025

📌 Post Extra — Micromégas, Senhores da Guerra e um Déjà Vu de 16 Anos

 
Hoje revisitei um texto que publiquei em 14/04/2009, minha segunda postagem no Declus.

O texto original pode ser lido aqui: O que fazem os senhores da guerra de seus "palácios".
Na época, escrevi inspirado por Micromégas, de Voltaire, e pelo clima geopolítico do momento: Barack Obama prometendo a retirada do Iraque e a Coreia do Norte expulsando inspetores da ONU.
Agora, 16 anos depois, reli esse texto e percebi que, infelizmente, algumas coisas mudaram bem menos do que gostaríamos...


O conto do mestre Voltaire fala sobre um ser de 100 km de altura vindo de Sírius que olha para a Terra e se espanta com a pequenez moral dos humanos.
Mesmo com corpos minúsculos, eles matavam uns aos outros com uma obstinação que parecia absurda ao visitante cósmico.
E quem puxava os gatilhos simbólicos? “Os bárbaros sedentários e indolentes que, de seus palácios, dão ordens para o assassinato de milhões de homens e depois, solenemente, agradecem a Deus pelo sucesso.”


2009: Obama, Iraque e uma aposta equivocada

Naquele abril, eu escrevia com um certo alívio: os EUA, sob Barack Obama, anunciavam a retirada gradual do Iraque.
Mas, no mesmo texto, citava a Coreia do Norte expulsando inspetores da ONU. E perguntava: “Alguém aí quer fazer uma aposta?”

Pois é.
16 anos depois, o mundo continuou apostando — e perdendo.
Se não foi no Iraque, foi na Síria. Se não foi na Coreia, foi em outros tabuleiros geopolíticos.
O século XXI herdou a lógica que Voltaire satirizou no século XVIII: a guerra como obra dos palácios, com o povo como estatística descartável.


2025: o que mudou?

Alguns dirão que evoluímos tecnologicamente, que temos mais informação, que há redes sociais expondo cada atrocidade em tempo real.
Mas a pergunta continua: mudou algo essencial?
Ainda há “chapéus contra turbantes” — só trocaram as cores, as bandeiras ou até os algoritmos que definem quem é o inimigo do dia.
Micromégas, se voltasse hoje, provavelmente se sentiria num déjà vu.
Talvez dissesse: “Vocês construíram foguetes para Marte, mas continuam esmagando uns aos outros com a mesma vontade de 300 anos atrás.”


Por que revisitamos isso?

Porque esse conto de Voltaire continua sendo uma metáfora poderosa.
Ele mostra o absurdo da violência quando visto de fora, de muito longe.
E nos lembra de algo incômodo: talvez precisemos de um “gigante de Sírius” imaginário para perceber o ridículo da nossa própria destruição.


Epígrafe:

“Os bárbaros sedentários e indolentes ainda estão lá, Dedé de 2009. Só trocaram a cor das paredes do palácio e as hashtags de guerra.”

🎧 O Eremitismo Mental Produtivo (A Arte de Ligar o Botão Fd-$)

  Epígrafe: "O mundo é como uma notificação irritante: você precisa silenciá-lo para conseguir ler o que está escrito dentro de si....