Declus

Tentando tapar os buracos na minha cabeça...

terça-feira, setembro 02, 2025

📽️ Mais Estranho que a Ficção

 

Têm filmes que não passam — permanecem.
Mais Estranho que a Ficção é um deles. Talvez seja a melancolia doce de Harold Crick, talvez a excentricidade da narradora, ou ainda o jeito como todos os personagens orbitam em torno de escolhas mínimas, quase invisíveis… Mas, sempre que revisito, ele me pega de novo.

É um filme sobre rotina, destino e liberdade. Mas também é sobre algo impossível de medir: a graça das pequenas coisas. O toque. O gesto. O bolo ruim. A música inesperada. O abraço que chega sem pedir licença. Coisas que parecem detalhes — mas que, no fundo, podem salvar vidas.

Assistir a “Mais Estranho que a Ficção” é como se lembrar de que não existe uma engrenagem invisível controlando tudo. Sempre há espaço para uma guinada, para uma desobediência, para um sopro de vida. E é estranho mesmo — porque não deveria fazer tanto sentido, mas faz.

E então, no final, vem aquele trecho. O que me pega todas as vezes. O que transforma um filme em lembrança, e lembrança em algo maior que nós mesmos:


*"Algumas vezes, quando nos perdemos no medo e desespero, na rotina e constância... na falta de esperança e drama... podemos agradecer a Deus por biscoitos de açúcar da Bavária.

E felizmente, quando não existem biscoitos, ainda podemos encontrar segurança em um toque familiar na nossa pele...

...ou em um gesto gentil e amoroso...

...em um sutil encorajamento...

...um abraço amoroso...

...ou numa oferta de conforto.

Sem falar das macas de hospital...

...e protetores de narinas...

...e um bolo dinamarquês incomível...

...e segredos sussurrados...

...e Fender Stratocasters...

...e talvez, um ocasional pedaço de ficção.

Precisamos lembrar que todas essas coisas... as nuances, as anomalias, as sutilezas, as quais presumimos que são apenas acessórios dos nossos dias, estão de fato aqui por uma causa muito maior e mais nobre...

...estão aqui para salvar nossas vidas."*


Estranho? Talvez.
Ficção? Nem tanto.

Epígrafe:
“Entre uma rotina e outra, sempre cabe um pedaço de ficção.”


🕳️ Post Extra — Quiet Cracking: Quando o Trabalho Desiste de Você

 

Já aconteceu de você estar ali, presente, mas invisível? Funcionando no automático, entregando o que pedem — mas sem voz, sem espaço, sem brilho? Pois é exatamente isso que o tal do Quiet Cracking representa: uma rachadura silenciosa que não acontece quando você desiste do trabalho, mas quando o trabalho começa a desistir de você.

O termo vem ganhando espaço no mundo corporativo, definido como a “rachadura silenciosa” que mina motivação, engajamento e saúde mental sem aviso. É como um espelho que deixa de refletir: você está lá, mas perdeu o espaço simbólico. O rompimento acontece no pacto invisível entre empresa e funcionário — aquele contrato não escrito de reconhecimento, confiança e investimento emocional.

E o detalhe cruel: esse fenômeno não escolhe cargo. Pode atingir estagiários, analistas, gerentes e até altos executivos. E quase nunca aparece em relatórios. Afinal, ele se instala por descuidos sutis: reuniões das quais você é excluído, feedbacks que nunca vêm, projetos que deixam de contar com sua participação. O silêncio se torna cotidiano.

Um estudo recente da TalentLMS mostrou que mais da metade dos trabalhadores americanos já sentiu o efeito do Quiet Cracking. E quase 20% vivem isso como rotina — silenciosa, mas dolorosa. Isso impacta eficiência, inovação e retenção. Porque, no fim, quem não se sente reconhecido deixa de ser ponte para o futuro e passa a ser visto (ou tratado) como obstáculo.

Como perceber (e reagir)

O Quiet Cracking é sutil, mas devastador. Ele revela falhas não no indivíduo, mas no ambiente que deveria sustentá-lo. Reconhecer isso é um primeiro passo poderoso — seja para reconstruir pontes, seja para traçar um novo caminho.

Epígrafe:
“Às vezes o silêncio não é paz. É sinal de rachadura.”


🔗 Referências consultadas

O Menino que Somou de 1 a 100 Antes do Professor

 

Imagina você, criança, levando bronca e castigo... por ser rápido demais na matemática. Foi mais ou menos isso que aconteceu com Carl Friedrich Gauss, que mais tarde seria chamado de “o príncipe dos matemáticos”.

Aos 7 anos, o professor quis manter a turma ocupada e passou um desafio: somar todos os números de 1 até 100. Um problema que parecia longo, trabalhoso, quase castigo. Só que Gauss olhou para a lousa, pensou alguns segundos e entregou o resultado correto: 5050.

O truque? Ele percebeu que, ao somar o primeiro com o último número (1 + 100), depois o segundo com o penúltimo (2 + 99), e assim por diante, sempre se chegava a 101. Como eram 50 pares, bastava multiplicar: 101 × 50 = 5050. Simples. Elegante. Poético.

Nascia ali a marca registrada de Gauss: ver padrões onde os outros só enxergavam esforço bruto. O episódio ficou famoso não porque ele resolveu uma conta rápido, mas porque mostrou um modo diferente de pensar — a matemática como pintura invisível da lógica, e não só como uma coleção de cálculos.

Esse pequeno lampejo de infância já anunciava a mente que, anos depois, revolucionaria a geometria, a estatística, a física e até a astronomia. Mas talvez a maior lição da história seja menos sobre genialidade e mais sobre perspectiva: às vezes, o que parece uma tarefa impossível pode se tornar simples se você mudar o ângulo.

✨ Epígrafe:
“Genialidade é ver o atalho que estava lá o tempo todo.”

segunda-feira, setembro 01, 2025

🧠 Reflexo Filosófico — O algoritmo vigia, logo resisto (Foucault e o GPS da alma)

 "Onde há poder, há resistência."

Michel Foucault

A frase parece um lema revolucionário, mas tem gosto de aviso sussurrado na porta de um elevador com câmera.

Foucault não enxergava o poder apenas nos governos ou nas polícias. Para ele, o poder está em todos os lugares — nos discursos, nas normas, nos olhares, nos hábitos. Ele não oprime diretamente. Ele molda, regula, forma.

E como todo poder tenta se fazer invisível, ele se esconde nas estruturas: nas escolas, nos hospitais, nos questionários de perfil de vaga de emprego. Hoje, também nos termos de uso que ninguém lê.

A frase — “onde há poder, há resistência” — é o lembrete de que a obediência nunca é absoluta. Mesmo sob vigilância, mesmo em silêncio, mesmo agindo como se tudo estivesse bem... há frestas. Há desvios. Há memes irônicos como forma de insubordinação.

No século XXI, o novo pastor digital se chama algoritmo. Ele recomenda vídeos, molda gostos, escolhe com quem você deve sair e o que você deve pensar — tudo “personalizado”. Mas Foucault estaria atento: quando até a liberdade é medida por clique, resistir pode ser simplesmente silenciar por escolha própria. Ou curtir algo que o sistema não recomendou.

A pergunta não é apenas quem te vigia.
Mas: o que você faz quando acha que ninguém está vendo?

O Matemático que Fugiu do Milhão (e do Mundo)

 Em 2003, um homem magro e discreto de São Petersburgo resolveu um dos maiores enigmas da matemática moderna: a Conjectura de Poincaré, um problema que atormentava mentes brilhantes havia mais de um século. Seu nome? Grigori Perelman.

A solução não foi apenas correta — foi genial. Tanto que rendeu a ele a Medalha Fields (o “Nobel da matemática”) e um prêmio de um milhão de dólares oferecido pelo Clay Mathematics Institute. Mas Perelman recusou tudo. Dinheiro, glória, títulos. Disse apenas que não precisava de nada daquilo.

Enquanto o mundo tentava decifrar sua equação, ele já estava vivendo a resposta: uma vida simples, reclusa, sem entrevistas, sem redes sociais, sem o frenesi que costuma engolir os gênios. Hoje, mora num apartamento modesto em São Petersburgo, passeia sozinho, cuida da mãe e raramente é visto em público.

Por que alguém abriria mão de fama e fortuna?
Talvez porque Perelman entendeu cedo que esses prêmios são apenas ornamentos — coroas para quem precisa ser lembrado. Ele, que decifrou uma das chaves do universo, parecia não precisar de mais nada.

Há quem diga que ele é excêntrico, ou até louco. Mas talvez seja apenas íntegro. Num mundo onde o sucesso é medido por curtidas, cifras e selfies no palco, um homem que resolve o universo e escolhe o anonimato soa quase como uma ofensa. E, por isso mesmo, torna-se ainda mais fascinante.

A história de Perelman nos obriga a perguntar: quantas conquistas nossas são, de fato, para nós — e quantas são apenas para provar algo aos outros?

Talvez a genialidade não esteja só em resolver problemas cósmicos, mas também em saber quando dizer: “isso não me pertence”.

Epígrafe:
“Há quem busque o palco. Perelman preferiu o silêncio — e, paradoxalmente, se tornou eterno.”

domingo, agosto 31, 2025

✨ Post Extra — Passei no teste?

 
De vez em quando, a vida dá uma trégua.

As vozes que normalmente gritam dentro da cabeça diminuem o volume, e o coração bate em compasso de música calma. Não porque tudo se resolveu — longe disso — mas porque, por um instante raro, tudo parece ocupar o lugar certo.

É como a velha síndrome do nariz entupido: só lembramos de como é bom respirar direito quando o ar falta. Quando o ar volta, sorrimos sozinhos, como se tivéssemos redescoberto um segredo antigo que sempre esteve ali.

Talvez seja a idade falando — aos 51, já acumulo batalhas vencidas, derrotas doloridas e empates esquecíveis. Não conquistei todas, nem cheguei perto disso. Mas lutei. E, no fim das contas, talvez seja isso que realmente pesa na balança: não a vitória absoluta, mas a disposição de ter entrado na arena.

Lembro de uma cena em O Senhor dos Anéis: Galadriel, diante de Frodo, com o Anel estendido. A tentação do poder absoluto, a promessa de ser temida e venerada. O brilho da luz e o peso da sombra, lado a lado. E então a escolha dela: recusar. Diminuir. Continuar sendo apenas o que é.
Ela passa no teste.

Será que a serenidade que, às vezes, nos visita não vem da vitória sobre tudo, mas da aceitação de que não precisamos vencer tudo? Que basta seguir, mais leves, respirando fundo, com a calma de quem já viu o bastante para não ser enganado pelo que ainda falta.

Talvez não seja uma grande lição. Talvez seja apenas isso: o teste passando.
E eu, quem diria, passando junto com ele.

Epígrafe:
"Às vezes, vencer é simplesmente aprender a descansar dentro da própria pele."

Henrietta Lacks e as Células que Não Morreram

Em 1951, Henrietta Lacks, uma mulher negra de 31 anos, foi diagnosticada com câncer cervical agressivo. Ela morreu pouco tempo depois, em um hospital para pessoas negras em Baltimore, sem saber que parte de seu corpo continuaria vivo — para sempre.

🧪 As células imortais
Durante seu tratamento, médicos coletaram amostras de tecido tumoral sem pedir consentimento. Essas células se revelaram únicas: ao contrário das outras, não morriam após algumas divisões. Replicavam-se indefinidamente. Nascia a linhagem celular HeLa — batizada a partir das iniciais de seu nome.

HeLa se tornou um milagre científico. Graças a essas células, foram desenvolvidas vacinas (como a da poliomielite), estudados efeitos da radiação, testados tratamentos contra o câncer, criadas técnicas de fertilização in vitro. Até hoje, em laboratórios do mundo inteiro, Henrietta ainda pulsa em tubos de ensaio.

⚖️ A ética que faltou
Mas esse avanço veio a um preço. Henrietta nunca soube, nunca foi perguntada, nunca recebeu crédito. Sua família só descobriu décadas depois que o corpo de sua mãe havia se tornado peça central da medicina moderna — enquanto eles próprios viviam na pobreza, sem acesso aos tratamentos que sua linhagem celular ajudou a desenvolver.

🌍 O corpo como símbolo
Henrietta Lacks se tornou, com o tempo, um ícone da discussão sobre ética médica, consentimento e racismo estrutural. Sua história expõe uma ferida: quantas vidas foram exploradas em nome da ciência, sem que houvesse respeito pelo indivíduo? E até onde podemos chamar de “avanço” algo que nasce da apropriação?

Para pensar
As células de Henrietta não pediram para viver para sempre. Mas vivem. Seu corpo, transformado em ciência, nos obriga a lembrar que cada descoberta carrega histórias humanas invisíveis. O progresso é real, mas não pode apagar quem foi usado como degrau.

Henrietta não escreveu fórmulas, não construiu máquinas, não assinou artigos. Mas deu, sem saber, a matéria-prima que moveu gerações de cientistas. Talvez, no fim, o mínimo que podemos fazer é lembrar o seu nome — e não apenas a sigla HeLa.


Epígrafe
“Henrietta não quis ser imortal. Mas a ciência decidiu por ela.”

🌬️ O Controle Que Nunca Tivemos (E Só Agora Percebemos)

  📌 Epígrafe: “O controle é confortável. Até que você descobre que nunca teve um.” Tem gente que descobre aos 20. Outros aos 40. Alguns… ...