O Mito da Liberdade Como Recompensa
Nós crescemos sob o mantra de que a liberdade é a maior das conquistas: a liberdade política, a liberdade de expressão, a liberdade de consumo. No entanto, o pensador Erich Fromm (e muitos existencialistas) nos confronta com uma verdade incômoda: a liberdade não é um prêmio; é um fardo.
Fromm, em sua obra clássica O Medo à Liberdade, argumenta que quando atingimos a autonomia, somos tomados por uma angústia existencial tão grande que a maioria de nós prefere, inconscientemente, fugir dela.
O ser plenamente humano é ser plenamente livre, mas essa plenitude exige a coragem de ser autêntico — e é aí que a maioria de nós falha.
Liberdade Vendida vs. Liberdade Real
Para entender por que fugimos, precisamos distinguir o que é a liberdade no marketing e o que ela realmente significa na filosofia.
| Tipo de Liberdade | Liberdade Vendida (Negativa) | Liberdade Real (Positiva - Fromm) |
| O que é? | Liberdade DE (de restrições). | Liberdade PARA (para criar, ser). |
| Exemplo: | Livre para escolher entre 30 marcas de pão; livre da censura. | Livre para decidir o seu próprio valor; livre para criar a sua própria moral. |
| Exigência: | Passividade, consumo e conformidade. | Responsabilidade radical e ação autêntica. |
| Resultado: | Uma sensação cômoda de autonomia que te deixa no piloto automático. | A angústia da escolha que te obriga a ser autor da sua vida. |
A Liberdade Vendida é a liberdade que o sistema lhe dá. Ela é segura porque é delimitada. Ela permite que você escolha um produto, um partido, um hobby — mas dentro de um menu pré-aprovado. Essa liberdade nos acalma, mas nos mantém escravos da conformidade.
O Preço de Sartre e a Condenação
O filósofo Jean-Paul Sartre foi mais radical: ele disse que estamos condenados a ser livres.
Se não há Deus ou propósito predefinido, cada uma de nossas escolhas define o que é ser "humano". Se você é livre, não há manual de instruções, não há desculpa, não há "destino" a culpar (como vimos no post anterior de Hume, a razão não pode ser a desculpa).
O medo de Fromm é o medo de Sartre: o terror de que, se somos totalmente livres, somos totalmente responsáveis por quem nos tornamos.
O Medo de Ser Autêntico
A fuga da liberdade acontece quando abrimos mão da nossa autenticidade e nos escondemos:
Na Conformidade: Você adota as opiniões do grupo (o exato oposto da "Síndrome do Intelectual Sem Foco"). Você se torna a média, e isso é seguro.
Na Destrutividade: Você tenta anular o mundo exterior para se sentir no controle (destruindo a liberdade alheia).
Na Autoridade: Você se submete a uma ideologia, religião ou líder forte. Você transfere o fardo da escolha para a "autoridade" e, finalmente, pode relaxar.
Ser plenamente livre, como diz Fromm, é ser plenamente humano: é assumir a totalidade do seu ser, com todos os riscos e angústias. É fazer a escolha mais difícil de todas: a de ser você mesmo, e não o personagem que os outros esperam.

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