O talento é uma benção, mas pode ser a armadilha mais sutil da vida.
A gente é ensinado a seguir aquilo em que já somos bons. E por um tempo, isso funciona. Você se destaca, recebe elogios, o dinheiro entra, e você se sente validado. Você é o craque do time, o mestre das planilhas, o expert em resolver problemas que ninguém mais quer.
Você se torna eficiente em algo que não lhe dá propósito, mas lhe dá conforto.
Chamo isso de Ikigai Reverso: você encontra a intersecção não da paixão e da missão, mas da competência e da conveniência. Você está fazendo algo que o mundo valoriza e paga bem, mas que, no fundo, você despreza e que esvazia a sua alma.
O Falso Conforto da Máscara
É o caminho mais perigoso de todos, pois não tem um grande fracasso que sirva de alerta. Não há drama. Há apenas uma lenta e confortável anestesia existencial.
O problema de ser bom em algo que você odeia é que a sua competência serve como uma máscara protetora. Ela te isola da necessidade de mudança.
"Não posso largar, sou o melhor nisso."
"Onde mais eu ganharia isso?"
"É chato, mas pelo menos sou respeitado."
Você confunde a segurança financeira com a plenitude da alma. O salário alto se torna o pagamento pelo seu tédio. E a sua habilidade em resolver problemas alheios te impede de encarar o seu próprio.
A Crise Silenciosa
A crise, quando chega, não é barulhenta; é silenciosa. Você percebe que está no auge de uma carreira que te entedia, cercado de pessoas que admiram sua performance, mas não a sua essência.
A diferença entre o talento sem paixão e o talento com propósito é que o primeiro é sustentável (dura por anos, se paga), mas o segundo é inadiável (não pode ser contido).
O Ikigai Reverso te mantém preso porque a zona de conforto da competência é acolhedora. É difícil largar o que você faz bem para ir atrás do que você ama, mas ainda faz mal.
Mas a única certeza é essa: o talento que não te serve será sempre um talento que aprisiona.
Talvez o verdadeiro ato de coragem não seja lutar pelo que você pode ser, mas fugir do que você já é — se isso for feito por obrigação, e não por alma.

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