Declus

Tentando tapar os buracos na minha cabeça...

sexta-feira, agosto 15, 2025

Tântalo e o Castigo da Sede Infinita

 
No mito grego, Tântalo foi condenado a um suplício peculiar: preso em um lago, com frutas ao alcance das mãos, mas incapaz de beber ou comer. A água recuava sempre que tentava beber. As frutas se afastavam sempre que esticava os dedos.

A punição era simples e cruel: desejar para sempre o que jamais poderia ter.

Tântalo encarna um tipo de sofrimento que parece muito moderno. Vivemos cercados de imagens, produtos e promessas — e, no entanto, o que queremos parece sempre um pouco além da borda. Um aumento de salário que nunca é suficiente. Um relacionamento que quase nos preenche. Um projeto que sempre fica para “quando sobrar tempo”.

Talvez por isso o mito ainda fale tanto com a gente: ele não é só sobre castigo divino, mas sobre o motor da nossa insatisfação. Afinal, não é essa distância — entre o que temos e o que sonhamos — que mantém a roda girando?
Ou será que estamos apenas repetindo, em versão 4K, o mesmo gesto de Tântalo: com a boca na água e a fome intacta?

quinta-feira, agosto 14, 2025

O que é mais antigo: a guerra ou o mito?

 

Antes de escrevermos, já lutávamos.
E, ao que tudo indica, também já contávamos histórias sobre por que lutávamos.
Pinturas rupestres mostram caçadas, combates, rituais.
Muito antes da palavra “história” existir, já havia sangue e narrativa.


📜 A espada ou a desculpa para usá-la?

A guerra pode ter nascido do medo, da sobrevivência, da disputa por comida, território, água.
Mas logo ganhou um enredo: deuses ordenando ataques, heróis conquistando glórias, monstros encarnando inimigos.
Talvez a pergunta certa seja: a guerra precisa do mito… ou o mito precisa da guerra?


🏺 Deuses com armaduras

Zeus não descia com ramos de oliveira; ele lançava raios.
Atena, deusa da sabedoria, também era deusa da guerra estratégica.
No Oriente, Shiva pode destruir mundos inteiros em sua dança.
📎 Quando olhamos para o passado, parece que nossos deuses nasceram já equipados para a batalha — como se a guerra fosse uma parte inevitável da narrativa humana.


📖 Narrativa como armadura emocional

Mesmo quando o conflito era simples — “aquele grupo quer nosso pasto” — a história precisava ser maior:

  • “Eles são bárbaros perigosos!”

  • “Nossos deuses exigem esta vitória!”
    📎 Contar uma história ajudava a lidar com a violência praticada. Transformava caos em sentido.


🧠 O que veio primeiro?

Talvez mito e guerra tenham nascido juntos, como irmãos gêmeos:
um para explicar por que lutamos, outro para garantir que continuaríamos lutando.
📎 A espada corta, mas é a história que convence a levantar a espada de novo.


💭 E hoje?

Ainda criamos mitos para guerras — só mudaram os nomes.
Chamamos de “defesa preventiva”, “operação de paz”, “libertação”.
No fundo, continuamos vestindo narrativas como armaduras emocionais.
Talvez isso diga mais sobre nós do que gostaríamos de admitir:
não sabemos viver sem histórias, nem sem conflitos.


Então, o que é mais antigo? A guerra ou o mito?
Talvez a resposta seja: nenhum começa sem o outro.

quarta-feira, agosto 13, 2025

📌 Post Extra — O Dragão na Garagem e o Olho do Ceará

 
Meu pai, que saiu do Ceará aos 18 e hoje já passou dos 70, gosta de contar histórias do sertão.

Uma delas reapareceu na sala esses dias, quando ele falava para minha sobrinha sobre um amigo de infância que machucou o olho. O médico — “daquele tempo”, como meu pai faz questão de frisar — disse que ele perderia a visão.

O amigo, então, recorreu à fé: fez uma promessa a São Francisco, o santo mais forte da região.
Uma semana depois, voltou ao médico (ao menos fez isso, ponto para ele) e ouviu o improvável:

— “Vai se curar.”

E se curou.

Essa história me lembrou de algo que sempre me intriga: a força do testemunho humano.
Não importa se é sobre um milagre no interior, um fantasma no corredor ou uma luz estranha no céu — quando alguém conta algo com emoção e detalhes, nossa mente preenche as lacunas como se fosse verdade absoluta.

Mas, como já dizia Carl Sagan:

“Alegações extraordinárias exigem evidências extraordinárias.”

No seu livro O Mundo Assombrado pelos Demônios, Sagan criou a metáfora do Dragão na Garagem: se alguém diz ter um dragão invisível e intangível vivendo na garagem, mas não há como medi-lo, fotografá-lo ou interagir com ele, qual a diferença prática entre existir e não existir?

James Randi, o grande ilusionista e cético, levou isso ao limite. Criador do famoso Desafio Paranormal, ofereceu um prêmio de 1 milhão de dólares a quem demonstrasse habilidades sobrenaturais sob condições controladas. Ninguém jamais conseguiu.

Richard Feynman, físico e eterno provocador de certezas absolutas, alertava:

“O primeiro princípio é que você não deve enganar a si mesmo — e você é a pessoa mais fácil de enganar.”

Richard Dawkins, por sua vez, argumenta que nossa mente evoluiu para detectar padrões e causalidades rapidamente, pois isso ajudava na sobrevivência — mas esse mesmo impulso nos faz ver conexões onde não existem, desde constelações até “curas” milagrosas.

Não estou aqui para negar o que meu pai viu, ou o que ele acredita ter visto.
A fé pode ser um pilar poderoso. Mas entre o milagre e a coincidência, o testemunho ocular é talvez a pior prova — não porque a pessoa esteja mentindo, mas porque nossa memória adora escrever ficção com cara de realidade.

📜 Epígrafe:
"Milagres acontecem. Mas, às vezes, o milagre é só a gente não perceber como foi que aconteceu."

Como seria seu blog se fosse encontrado por alienígenas?

 

👽 Imagine a cena:
Uma nave alienígena chega à Terra, encontra ruínas, poeira, talvez uma ou duas baratas sobrevivendo.
E, no meio desse cenário pós-humano… o seu blog.
Sim, aquele com textos sobre viagens, listas de livros, fotos de almoço e reflexões sobre segunda-feira.


📡 O que eles entenderiam da gente?

Talvez achassem que amávamos gatos mais do que qualquer outra espécie.
Ou que éramos uma civilização obcecada com dicas de produtividade — e ainda assim vivíamos atrasados.
Podem pensar que “café” era um combustível sagrado, que “ansiedade” era uma divindade cultuada e que emojis eram parte de um alfabeto secreto.

E quem garante que não achariam os comentários mais importantes que os próprios posts?
— “Interessante.”
— “Primeiro.”
— “Segue de volta?”


📝 A curadoria que ninguém planejou

Nossos blogs são diários públicos disfarçados.
Guardam paixões passageiras, opiniões que mudam com o tempo, conquistas que já esquecemos.
📎 Se um alienígena quisesse montar um retrato da humanidade só com blogs, talvez chegasse à conclusão de que vivíamos em busca de sentido — e escrevendo para ninguém e para todos ao mesmo tempo.


🌌 A arqueologia digital do improvável

Pense bem: um blog é pessoal e coletivo.
É sua vida, mas também uma parte de um ecossistema de links, tags, comentários, referências.
📎 Encontrar um blog é quase encontrar uma garrafa com uma mensagem no oceano — só que esse oceano é infinito e cheio de outras garrafas.


💭 E o que você gostaria que eles vissem?

Seu blog como um mapa de ideias?
Uma carta de amor disfarçada?
Ou só uma coleção de posts aleatórios que, sem querer, mostram muito mais sobre você do que imaginava?


Talvez, no fim, os alienígenas não queiram nossa tecnologia ou nossos monumentos.
Talvez só queiram entender por que escrevemos tanto para ninguém em especial.


Nota do autor:
Sim, café é um combustível sagrado!

terça-feira, agosto 12, 2025

📌 Post Extra — Esquiva Experiencial: quando a organização vira fuga

 Existe um termo bonito na psicologia chamado Esquiva Experiencial.

Traduzindo para o concurseirês: é quando a gente foge do que realmente precisa fazer, se ocupando com qualquer outra coisa que dê a sensação de progresso… mas sem colocar a mão na massa.

🎯 O mestre da fuga organizada
Eu já fui especialista nisso. Passava horas criando planilhas coloridas, testando aplicativos milagrosos, ajustando post-its por cor e importância.
Cada ciclo de estudo era tão detalhado que mais parecia um plano de invasão militar.
O problema? Quando eu finalmente terminava de organizar… já não sobrava tempo — ou energia — para estudar.

📱 Quando até a desculpa fica obsoleta
Hoje, a “indústria dos concursos” praticamente entrega tudo pronto: ciclos automáticos, resumos, mapas mentais, simulados, cronômetros.
Não tem mais desculpa. Basta abrir, seguir e… estudar.

💺 O verdadeiro segredo
E aí está a parte que ninguém gosta de ouvir: o que realmente muda o jogo é o famoso HBC — Hora de Bunda na Cadeira.
Não importa se seu caderno é minimalista ou tem capa com glitter.
Não importa se o app tem modo noturno ou toca musiquinha lo-fi.
O que importa é sentar e fazer.

🚶‍♂️ Organizar sem agir
Porque, no fim, organizar sem executar é como comprar uma esteira e usá-la de cabide:
dá a falsa sensação de que você está no caminho certo, mas no fundo… você nem saiu do lugar.


💭 Epígrafe: "Organizar é fácil. Difícil é ter coragem de sentar e fazer o que precisa ser feito."

Deméter e o Cansaço do Ciclo Infinito

 
🌾 Deméter sabia o que era perder.

Quando sua filha Perséfone foi levada ao submundo, a deusa da colheita entrou em luto — e o mundo sentiu.
📎 As plantas murcharam, o frio tomou conta e, assim, nasceu o inverno.

A mitologia grega usou essa dor para explicar algo que todo mundo conhece: a vida é feita de ciclos.
A perda dá lugar ao retorno.
A primavera sempre vem… mas só depois de um inverno longo e silencioso.


🔄 Ciclos modernos (e igualmente cansativos)

Hoje, não dependemos de colheitas para sobreviver, mas nossos ciclos são outros:

  • Trabalhar, pagar contas, descansar um pouco, repetir.

  • Se apaixonar, perder, superar, tentar de novo.

  • Animar-se no começo do ano e, em agosto, já sonhar com as férias.

📎 Assim como Deméter, carregamos uma exaustão silenciosa: o peso do recomeço inevitável.


🕰 O lado bom (e o lado cruel) do eterno retorno

Há quem ache conforto no previsível: o que desce, sobe; o que morre, renasce.
Mas há dias em que parece que o ciclo não é renovação — é prisão repetitiva.
📎 Como um despertador sem botão de soneca: acordar, repetir, fingir surpresa quando o dia termina igual.

Será que somos todos pequenos Deméter, tentando forçar a primavera com as mãos?


🌱 O descanso da terra (e o nosso)

Na mitologia, o inverno de Deméter não era punição. Era pausa.
O solo precisava parar para depois florescer de novo.
Talvez seja isso que esquecemos: até o mito deu um tempo.

📎 Se a deusa da colheita pôde desacelerar, por que nós não?
Quem sabe, em vez de lutar contra os ciclos, devêssemos aprender a descansar dentro deles.


💭 E se aceitássemos os invernos pessoais como parte da história?

Pode soar estranho, mas às vezes o frio é necessário para preparar o calor que vem depois.
Deméter, no fundo, nos lembra:
📎 não há primavera sem pausa, nem colheita sem semente enterrada.

segunda-feira, agosto 11, 2025

📌 Post Extra — O Sagrado e o Humano

Se a religião fosse apenas um hobby, como colecionar selos ou aprender violão, não teria atravessado milênios, nem sobrevivido às guerras, às revoluções científicas e à internet.

Desde que o ser humano aprendeu a enterrar seus mortos, parece incapaz de viver sem tentar costurar uma narrativa maior que explique a própria existência. É aí que entra a religião: como sentido pronto, conforto imediato, e linguagem para o inexplicável.

Sigmund Freud, em O Futuro de uma Ilusão (1927), descreveu a religião como uma “ilusão necessária”, nascida do desejo por proteção e consolo diante da insegurança e da morte. Para ele, trata-se quase de uma “neurose coletiva” — não como ofensa, mas como um mecanismo psíquico natural, uma forma de nos acalmar diante do caos.

Já Émile Durkheim, pai da sociologia, via a religião como cimento social. Em As Formas Elementares da Vida Religiosa (1912), argumenta que ela nasce da necessidade de unir o grupo em torno de valores e símbolos comuns. A religião, para ele, é menos sobre adorar deuses e mais sobre a própria sociedade se venerando.

Carl Gustav Jung foi além: para ele, a religião expressa arquétipos do inconsciente coletivo. Não é opcional, como um passatempo; é manifestação inevitável de padrões profundos da psique humana — especialmente na busca por sentido.

Mircea Eliade, historiador das religiões, via o “sagrado” como dimensão fundamental da experiência humana. Para ele, somos homo religiosus por natureza: desde as primeiras pinturas rupestres até as catedrais, sempre marcamos o mundo com símbolos e rituais para lembrar que existe algo “além”.

E Viktor Frankl, criador da logoterapia e sobrevivente de campos de concentração, resumiu de forma talvez mais humana: a maior necessidade do homem é encontrar sentido. Para muitos, a religião cumpre exatamente esse papel — oferecer uma narrativa para a vida e para a morte.

Talvez por isso discutir religião seja tão difícil. Não é só sobre dogmas, ritos ou livros sagrados, mas sobre uma parte íntima da arquitetura mental humana. Um espaço onde, mesmo no silêncio, sempre ecoa a pergunta: por quê?

💭 Epígrafe:

"O homem pode viver sem muitas coisas. Mas até hoje ninguém viveu sem uma história para acreditar." 

🔎 Olhar Curioso — A Peça de Teatro Onde Lincoln Morreu (e Outras Obras Que Viraram Ninguém)

Em 14 de abril de 1865 , no Ford’s Theatre em Washington, a plateia assistia a uma comédia leve chamada Our American Cousin . Era uma noite...