đ “Este Ă© o evangelho segundo Biff, o melhor amigo de infĂąncia de Jesus.”
Ă assim que começa O Cordeiro, de Christopher Moore — e Ă© nesse tom que ele segue: espirituoso, ousado, desconcertantemente comovente. Um livro que poderia ser apenas uma parĂłdia, mas que Ă©, na verdade, uma das homenagens mais sensĂveis (e engraçadas) jĂĄ feitas ao lado humano de uma figura sagrada.
đŹ Jesus e Biff: uma amizade de carne e alma
Na narrativa, Levi — apelidado de Biff — Ă© o amigo meio encrenqueiro, meio filĂłsofo de rua, que acompanhou o Messias desde a infĂąncia. Enquanto Jesus (a quem Biff chama de Josh) tenta entender sua missĂŁo, Biff Ă© quem questiona, provoca, reclama… e o segue mesmo quando nĂŁo entende nada.
Eles viajam juntos pela Ăndia, China e Himalaias, aprendem com monges, magos, mercadores, prostitutas e um yeti. Isso mesmo: um yeti. Porque neste evangelho, o divino e o absurdo caminham lado a lado — e Ă© justamente aĂ que estĂĄ sua beleza.
đ Rir sem blasfemar, sentir sem pregar
Moore nĂŁo tenta “reescrever a BĂblia”. Ele imagina o que poderia ter havido nos anos em que os evangelhos oficiais silenciam. O faz com respeito e irreverĂȘncia, ironia e ternura. HĂĄ piadas com anjos viciados em sabĂŁo, mas tambĂ©m reflexĂ”es sobre compaixĂŁo, escolhas difĂceis e a solidĂŁo do sagrado.
O humor nĂŁo zomba da fĂ© — apenas ilumina seus cantos escuros com um candelabro de sarcasmo amoroso. O riso que Moore provoca nĂŁo desvia da cruz: apenas lembra que, antes dela, houve abraços, tropeços e olhares perdidos em busca de sentido.
đ Entre o sagrado e o profano, um abraço possĂvel
O livro Ă© uma aula de equilĂbrio. Consegue colocar no mesmo parĂĄgrafo uma piada sobre romanos e uma meditação sobre sacrifĂcio. NĂŁo oferece dogmas nem pretensĂ”es teolĂłgicas — apenas uma histĂłria sobre amizade, busca e humanidade.
E talvez, no fundo, seja isso que um “evangelho” sempre tentou ser: uma boa nova. Mesmo que contada por Biff, o amigo boca suja e leal atĂ© o fim.
đ Por que ler “O Cordeiro” na vĂ©spera de fazer mais um ano de vida
Porque Ă© uma lembrança de que crescer (ou envelhecer) nĂŁo precisa ser sisudo. Que fĂ© pode rimar com humor. Que reverĂȘncia nĂŁo exclui liberdade. E que Ă© possĂvel rir das nossas dĂșvidas sem perder o respeito por quem tenta respondĂȘ-las com amor.
Porque às vezes a maturidade chega junto com a gargalhada de um anjo que derrubou o shampoo no Céu.
Um Ăłtimo livro, irreverente e inteligente.
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